Na Assembleia Municipal realizada no passado dia 25 de novembro coloquei, no período reservado ao público, duas questões ao Presidente da Câmara: uma sobre a passagem da gestão do Museu Regional para a Direção Regional da Cultura do Alentejo e outra sobre a situação da villa romana de Pisões. Fi-lo, face à ausência de notícias sobre ambos e, nomeadamente em relação ao museu, porque o Decreto-Lei n.º 78/2019, de 5 de junho, que o passou para a dependência da DRCA estabelecia que “Os autos de transferência [com a CIMBAL] devem ser celebrados no prazo de 60 dias após a data de entrada em vigor [desse diploma]“, ou seja até 5 de agosto. Ora, quase quatro meses depois, tal ainda não se tinha verificado.
Isto mesmo foi confirmado por Paulo Arsénio, que adiantou que tal se devia à falta de acordo entre as duas entidades sobre um aspeto em particular, o que atrasava a elaboração do documento. Sobre Pisões, referiu que se aguardava a resposta a uma candidatura a fundos comunitários, apresentada em conjunto pela Universidade de Évora e pela Câmara Municipal de Beja, com vista à recuperação e dinamização desse espaço.
Sem querer voltar à polémica que
se instalou aquando da passagem da gestão do museu e de Pisões para as duas
entidades, volto ao assunto, para apresentar uma proposta para a gestão
partilhada de dois dos mais importantes elementos da História e do Património
de Beja e do seu Concelho. Faço-o, tão somente, por uma questão de cidadania, que
implica, entre outros aspetos, a partilha de ideias e de opiniões, quando as
mesmas podem contribuir para o progresso e para o desenvolvimento das
comunidades onde vivemos (ainda que, na maior parte das vezes, sejam
olimpicamente ignoradas por quem apregoa a participação popular como uma das
marcas dos seus mandatos políticos).
Começo por recuperar um artigo de Santiago
Macias, neste mesmo jornal, no dia 5 de abril do ano passado, sobre Pisões: http://avenidadasaluquia34.blogspot.com/2019/04/quinta-coluna-n-2-pisoes.html .
Das
cinco ideias/propostas que apresenta, destaco a terceira : “Como potenciar o sítio? (…) A solução mais lógica é a da ligação de
Pisões ao Museu Regional. Que, estranhamente, sempre esteve à margem do que em
Pisões se foi passando. A duplicação de custos (dois equipamentos, duas equipas
de funcionários) parece-me, no mínimo, utópica”.
Concordo, no essencial, com esta proposta. Há
ainda outros aspetos que a justificam e que SM não referiu. Em minha opinião,
essa ligação poderia/deveria passar por um modelo que, agregando as três
entidades – Direção Regional, Universidade e Câmara Municipal – desse origem a
uma única entidade responsável pela gestão conjunta do museu (incluído
naturalmente o seu Núcleo Visigótico), de Pisões e, eventualmente, do Núcleo
Museológico da Rua do Sembrano. Deixo de fora o Centro de Arqueologia e Artes e
o sítio arqueológico anexo, que aguardam, por parte da autarquia, uma decisão
sobre o seu futuro e modelo de funcionamento.
Essa nova entidade deveria ter uma
administração tripartida, coadjuvada por um conselho consultivo alargado e, tal
como prevê o citado decreto-lei, um diretor recrutado “…através de concurso público (…) a quem são delegadas competências para
uma gestão responsável, que prime pela transparência e pelo cumprimento do
quadro legal vigente e que se adeque às características do equipamento em
causa, permitindo agilizar a operacionalização do seu plano de atividades do
setor”.
É claro que esta proposta não será fácil de
implementar, por duas razões de fundo : pelo conservadorismo que perpassa por
toda a nossa Administração Pública, que dificulta/impede inovadoras e mais
ágeis formas de gestão da “coisa pública” e pelo chamado “establishment administrativo”,
designação há dias usada por Luís Raposo num artigo no Público (edição online
de 3 de janeiro), precisamente intitulado “O desafio dos museus em 2020”, onde
coloca uma série de questões acerca dos problemas que afetam os museus
nacionais e o novo modelo de autonomia de gestão definido
pelo decreto-lei de junho de 2019, que “…poderá
contribuir de alguma forma para atenuar o mal indicado [a rarefacção
dramática das equipas dos museus], ainda que se avolumem “…as dúvidas quanto à
lisura da sua aplicação e até quanto à sua efectiva utilidade.”
Para concluir, refiro que, se houver interesse
em estudar algo de semelhante, basta percorrer cerca de 250 quilómetros e
contatar o “Consorcio de la Ciudad Monumental,
Histórico-Artística y Arqueológica de Mérida”, uma entidade de direito público,
formada pela Junta da Extremadura, Ministério da Educação, Diputación
Provincial de Badajoz, Assembleia da Extremadura e Ayuntamiento de
Mérida , que “… tem como objeto a cooperação económica, técnica e
administrativa entre essas entidades, para a gestão, organização e
intensificação das atuações relativas à conservação, restauração, acrescentamento
e revalorização da riqueza arqueológica e monumental de Mérida”: https://www.consorciomerida.org/ .
Descontando o número e a monumentalidade do
legado da Augusta Emerita (Património da Humanidade desde 1993), muito
superior ao da nossa Pax Julia, bem como as caraterísticas específicas
de ordem político-administrativa (existência de um poder regional – assembleia,
junta e diputatión), uma solução parecida poderia igualmente potenciar o
desenvolvimento/modernização das duas “jóias da coroa” do nosso património. Assim
se queira aplicar algo cada vez mais necessário : a cooperação.
Concluo, voltando ao artigo de Santiago Macias
porque, quer para as propostas nele contidas, quer para a que apresento, há
algo que é decisivo e que ele resume nesta frase: “ O problema está em Beja e é
em Beja que a solução tem de estar. Falta, enfim, como em tantas coisas nesta
vida, “quem se chegue à frente”. Sem um protagonista não haverá solução, ou não
fossemos nós uma sociedade de homens providenciais… Também se pode, claro está,
continuar a dizer que a culpa “é de Évora”. É sempre mais fácil. E, localmente,
rende mais “.
10.01.2020 |